Brasília — Uma disputa política intensa se instalou no Congresso Nacional em torno de propostas que podem alterar profundamente a jornada de trabalho no país, abrindo caminho para a chamada “escala 7×0”, que permitiria que trabalhadores atuassem sete dias consecutivos sem folga.

A discussão ganhou força após a edição, em novembro de 2023, da Portaria nº 3.665/2023, do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que reforçou a necessidade de convenção coletiva para autorizar o trabalho em feriados e assegurou o descanso semanal, preferencialmente aos domingos.O movimento para derrubar essa portaria e flexibilizar ainda mais a legislação trabalhista tem sido liderado principalmente por parlamentares ligados ao Centrão e a setores conservadores do Congresso, que defendem maior liberdade para as empresas organizarem escalas de trabalho.
Entre eles estão nomes como o deputado Elmar Nascimento (União Brasil-BA) e parlamentares do PL, partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, que articulam projetos para sustar os efeitos da portaria do MTE.Em oposição firme, figuras da esquerda criticam o que consideram um retrocesso histórico nos direitos trabalhistas.
O deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) classificou a ideia de permitir trabalho contínuo sem descanso semanal como “um absurdo completo”. Já a deputada Erika Hilton (PSOL-SP), além de repudiar a possibilidade do 7×0, apresentou a PEC 8/25, que propõe uma jornada oposta: o modelo 4×3, com quatro dias de trabalho seguidos por três dias de folga.
A questão ganhou contornos ainda mais tensos após declaração de setores empresariais e financeiros favoráveis à flexibilização, sob o argumento de que a portaria do MTE engessa o setor produtivo e prejudica a economia.Enquanto isso, a sociedade civil e sindicatos alertam para riscos de retrocessos constitucionais, uma vez que o descanso semanal remunerado é assegurado pelo artigo 7º da Constituição Federal. Advogados trabalhistas indicam que, caso aprovado, o regime 7×0 seria imediatamente judicializado por violar direitos fundamentais dos trabalhadores.
Segundo levantamento da Genial/Quaest, divulgado nesta semana, cerca de 70% dos deputados federais se posicionam contra acabar com a escala 6×1, o que cria barreiras à aprovação de uma jornada sem folgas. Ainda assim, projetos seguem avançando, principalmente no Senado, onde há pelo menos três proposições para revogar a portaria do MTE e abrir espaço para a negociação direta de jornadas, inclusive sem descanso semanal.Se o Senado aprovar alguma dessas propostas, o texto precisará retornar à Câmara para nova votação.
Caso siga adiante, poderá ser sancionado ou vetado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que ainda não se posicionou publicamente sobre a possibilidade do regime 7×0, mas cuja base no Congresso já se mostra resistente à medida.
O tema promete ser uma das pautas mais explosivas do segundo semestre, colocando em rota de colisão bancadas patronais e trabalhistas, num embate que vai além da legislação e toca direitos considerados históricos no Brasil.